segunda-feira, novembro 26, 2007

PARA PENSAR: RELAÇÃO ENTRE ESTÍMULOS E ESPONTANEIDADE NA VIDA MODERNA (I)

«O homem é construído para uma vida na qual estímulos e actividade espontânea estejam em equilíbrio. Demonstra-o a sua estrutura anatómica. Esta, pelo menos esta, pode justificar uma prevalência da espontaneidade.
Os órgãos dos sentidos recebem o exterior; o resto do corpo humano, à parte aquilo que está destinado à própria conservação, parece destinado de modo prevalecente à espontaneidade. É o caso do cérebro, da voz, dos braços, pernas, órgãos genitais.
Na vida moderna, o estímulo está em clara prevalência sobre a actividade espontânea. Isto é um grave sinal de decadência vital. O homem moderno fala muito menos do que o antigo e, em geral, dá uma importância muito menor à palavra pronunciada como meio de expressão. História do conceito de lógos. Importância oratória no mundo antigo.
Hoje pensa-se: aquilo que digo também o posso escrever, e não apenas será a mesma coisa, mas adquirirá uma importância bastante maior. Este pensamento é catastrófico para a cultura humana. Isto enraizou-se no início da Idade Moderna (mas já era aceite na Antiguidade tardia) por duas razões principais: o enfraquecimento de uma vida citadina, em cuja autonomia política e cultural estivesse o direito e o dever de uma comunidade restrita (cujos componentes se conheciam pessoalmente e discutiam em conjunto sobre todas as coisas), ao passo que o Estado se engrandece e a relação entre súbditos, que de algum modo têm interesses afins, se torna mais difícil; a facilidade de transmissão e difusão dos escritos (invenção da imprensa).»

(continua)

Excertos do livro La Ragione Errabonda, de Giorgio Colli, Edit. por Enrico Colli, Adelphi, Milano, 1982. Tradução não publicada de Maria Filomena Molder

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