domingo, janeiro 28, 2007

SOBRE O REFERENDO DO ABORTO

Devo começar por dizer que vou votar 'não'. Da mesma forma que votei 'não' no referendo de 1998. Entre um e outro muita coisa mudou na minha forma de percepcionar o aborto. De uma opinião moderada passei para uma opinião no limite. Considero a existência de pré-campanhas e campanhas um absurdo e uma imbecilidade. Porque este é, sobretudo, um referendo à nossa consciência ética e não estética. E a ética não é camaleão. Por outro lado, os movimentos políticos (de cívicos não têm absolutamente nada) que se criaram (uma espécie de guardiões das verdades absolutas de cada um) não esclarecem, apenas tentam convencer usando para isso estratégias da psicologia do marketing como a associação de "figuras públicas" à "causa" por forma a convencer as pessoas por identificação, até porque eles sabem que pensar dá muito trabalho. Enfim, sempre mais do mesmo. Mas nada me espanta. Os portugueses precisam disto como de pão para a boca.

A maioria dos argumentos que têm sido cuspidos um pouco por toda a parte, diria que são argumentos moderados. Discute-se uma consequência: o aborto. Então e as causas? Ainda por cima se considerarem esta questão uma questão de saúde pública mais uma razão para discutirmos as causas. Eu sei que não tem interesse "jornalístico" (já para não falar no embaraço que causaria ao Governo) pois nas causas do aborto (e refiro-me sobretudo a causas sociais) o "sim" e o "não" não polemizam. Este desinteresse acaba por ser confortável aos políticos que de olhos fechados esperam que tudo passe sem darem pela sua incompetência na resolução das causas.

Mas a consequência, isto é, o aborto, também carece de reflexão. Achava extremamente útil uma discussão séria e desinteressada e no limite dos possíveis sobre a seguinte questão: porquê 10 semanas? Criar a ilusão que o tempo é fundamental no processo de decisão não me convence. Precisamente porque não considero que esta seja uma questão estética em que o que ontem foi monstro hoje é belo. Se me disserem que durante os 9 meses a mulher pode fazer o que quiser ao que está dentro da sua barriga então aceito o argumento embora não adira. É claro que esta descentralização não tem sucesso nenhum porque a maioria das pessoas não são psicopatas (acho eu mas também não conheço a maioria das pessoas). Mas não deixa de ser interessante discutir o aborto no limite dos possíveis, isto é, no limite da nossa consciência ética.

Só para rematar, todo este tumulto em torno do aborto não deixa de ser irónico, por duas razões: primeiro, porque vivemos na época do preservativo e da pílula do dia seguinte (a propósito, os preservativos vão ficando cada vez mais caros sob o pretexto de um novo sabor ou de uma nova forma); segundo, porque, ao fim e ao cabo, tudo isto não deixa de ser um país de velhos a discutir o aborto. Serão os velhos do Restelo?!

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A propósito de velhice, o Expresso de 27-01-2007 refere «um estudo feito pela Associação Portuguesa das Famílias Numerosas (APFN) e dois professores da Universidade Nova de Lisboa que indica que em 2050 haverá menos 60% de jovens com 21 anos e menos 30% com 18 anos.» Portanto, a ironia mantém-se.

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