sábado, maio 24, 2008

NOTAS AVULSAS DE UM DESASSOSSEGADO

Lá fora chove a mesma água de sempre.
Homens e mulheres enganam-se uns aos outros e, na maior parte dos casos, a eles próprios.
Os jornais e as revistas insistem na treta do costume. Aliás, nos costumes da treta. Futebol, futebol e mais futebol. O jogador X que comprou um carro no valor de 1 milhão de euros e que é um tipo bestial porque ajuda muito a família. O jogador Y que gosta de comer atum directamente da lata e por isso é um rebelde com pinta. O jogador Z que é um porreiraço e que foi apanhado com umas prostitutas num quarto de luxo de um hotel de luxo mas que é prontamente desculpado pois é um craque e é jovem e tem é que aproveitar a vida e ninguém tem nada a ver com isso. Futebol, futebol e mais futebol. As revistas cor-de-rosa dedicam especial atenção aos carros dos jogadores e, sobretudo, quanto custam. O povo, esse, delira. E vibra. Trata-os como heróis de uma banda desenhada. Ninguém sabe explicar porquê.

Lá fora chove a mesma água de sempre.
Procuro desesperadamente sossegar o meu desassossego.
A lógica da vida finta-me. E atira-me contra a parede. E ri-se de mim.
Os tempos são de decadência. E nestes tempos nem sequer o homem marçano consegue ser feliz.
O menino foi atirado fora juntamente com a água do banho. E o amor também. Deixámos de querer «estar com» para passármos a não saber o que querer. Os afectos foram despedaçados. E embalados. O mundo vive o seu dia-a-dia como se fosse livros da Anita. O sentido da vida e a intimidade ardem agora bem à nossa frente. Há-de chegar o dia, triste dia, em que iremos procurar nas cinzas o dia em que acreditávamos mesmo que íamos mesmo ser felizes para sempre. E nesse mesmo instante iremos perceber que a cinza é nada. E que o mundo se perdeu para sempre.

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