quarta-feira, fevereiro 07, 2007

ECDU

Tenho-me deparado com algumas «discussões de gabinete» sobre a revisão do ECDU (Estatuto da Carreira Docente Universitária) que me parecem muito interessantes. Porém, não deixa de ser curioso que algumas destas discussões se passam do lado de fora, isto é, de gente que se encontra fora do país em programas de pós-graduação (doutoramentos, pós-doutoramentos ou especializações). Aliás, um contributo interessante vem precisamente da PAPS (Portuguese American Post-Graduate Society) que considera esta revisão fundamental na promoção da excelência do Ensino Superior. E tem toda a razão. É que as nossas universidades estão pejadas de compadres e de incompetentes. Eu conheço meia dúzia de casos de "professores doutores" que usam precisamente esse revestimento do professor doutor por forma a encobrir a sua incompetência intelectual, técnica, científica e/ou pedagógica. Em alguns casos a progressão na carreira docente universitária faz-se na rede de conhecimentos, com todos a coçarem as costas uns aos outros (é quase uma condição de sobrevivência). É claro que disto resulta uma qualidade de ensino medíocre. Há aqui, no entanto, uma partilha de culpas com os alunos. Na maior parte dos casos, as associações dos estudantes centralizam-se no que não tem interesse nenhum discutir, não sobrando tempo nem espaço para a exigência. Eu, por exemplo, que ainda ando neste mundo como aluno, não tolero fraudes e não tenho qualquer tipo de problema em levantar-me e vir-me embora. Ou então em recusar ser aluno de determinado professor (tenho alguns na minha lista negra). É claro que não estou a defender um professor para um aluno, estou a referir-me apenas aos casos grosseiros. Também já tive a oportunidade de estar do lado de lá e, ao fim de algum tempo, deu para compreender perfeitamente toda a engrenagem. Por exemplo, uma das condições importante para progredir na carreira é cair nas graças dos chefes dos departamentos. E quando digo cair nas graças não estou a insinuar qualquer relação de cariz sexual (que duvido que não haja mas não conheço nenhum caso) mas antes uma espontaneidade, por parte do "mancebo", no enriquecimento do curriculum vitae dos seus superiores. Precisamente por essa razão alguns dos trabalhos que são feitos em ambiente universitário têm uma série de co-autores. Por outro lado, também é relevante a orientação de teses conducente ao grau de doutor para efeitos de progressão na carreira (de assistente a professor auxiliar). Ou ainda a animosidade descarada entre “colegas” em que vence sempre o mais forte, isto é, aquele que não cair nas graças dos superiores. No final, como sempre, quem se lixa é o mexilhão.

Uma última nota sobre as universidades privadas. É que, por vezes, o negócio sobrepõe-se à qualidade do ensino. Vejamos um exemplo: a Universidade Lusófona recentemente criou a licenciatura em Medicina Veterinária (como se sabe, é um curso apetecível, sempre com muitos candidatos que todos os anos ficam de fora no concurso de acesso ao ensino superior público). Só para se perceber a dimensão do negócio, note-se que o valor da matrícula, nesta universidade, é de EUR 4.900,00 (com uma propina mensal de EUR 558,00). Isto significa que quem não é admitido no público tem a oportunidade de ingressar no privado. Claro está que este ingresso tem como principal critério ser-se rico, ter ganho a lotaria ou ter ido a um banco qualquer endividar-se até ao tutano. Tudo isto é legítimo e legal. O que me preocupa é o corpo docente deste curso, na maior parte dos casos sem qualquer qualificação científico-pedagógica, bastando apenas ter uma licenciatura em medicina veterinária e ter ido a uma dúzia de congressos. Porém, isto não quer dizer que esse mesmo corpo docente não seja capaz de desempenhar a sua tarefa. Muito provavelmente é. E eu até acho que muitos licenciados fazem melhor figura do que muitos doutorados. Este caso é paradigmático porque contrasta com outros dentro da mesma universidade. Por exemplo, na licenciatura em Biologia da Universidade Lusófona quase todos os elementos do corpo docente são doutorados (e aqueles que não são encontram-se a preparar as suas teses de doutoramento) com ampla experiência no campo da investigação científica e treino pedagógico. Dir-me-ão que há doutores que são uma autêntica nódoa como professores e é verdade. Daí a necessidade de estabelecer regras muito precisas de acesso à carreira docente universitária mas com efeitos retroactivos. É, pois, fundamental e urgente separar o trigo do joio porque só assim teremos um corpo docente altamente qualificado, competente e eficiente, o que significa um ensino de melhor qualidade, o que significa uma melhor preparação dos alunos.

Nota: devo dizer que, contrariando a regra, tive e tenho excelentes professores, dignos desse nome. Em todos eles encontro um traço comum: conhecimento, experiência, competência e humanidade. São, pois, estes os verdadeiros Mestres.

Um texto interessante, intitulado Universidades e Agências de Emprego, da autoria de Clara Pinto Correia, pode ser lido aqui.

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