domingo, fevereiro 05, 2006

O KARMA DE CLARA PINTO CORREIA
Parte I


Repito o exercício com alguma frequência. Vou ao Google e faço uma pesquisa por Clara Pinto Correia. Em 0,31 segundos o google devolve-me cerca de 45.100 resultados. Depois estreito o foco de pesquisa para páginas de Portugal e obtenho em 0,10 segundos cerca de 757 resultados. A tarefa seguinte é ver os conteúdos. Depois de uma análise muito superficial, dá logo para perceber a perversidade do google. Os primeiros resultados apresentados têm sempre uma apreciação negativa daquilo que se pesquisa. Neste caso, facilmente diagnosticamos uma ligação crónica entre Clara Pinto Correia e a palavra plágio. Ora isto merece uma análise séria porque não me parece sensato que 32 anos depois continue a haver uma perseguição inquisitória de nomes. É certo que a grande conquista do 25 de Abril de 1974 foi a queda do regime ditatorial e não propriamente a conquista da liberdade. Sim, eu sei que é um silogismo. O regime ditatorial não tolerava a liberdade. O regime ditatorial foi deposto. Logo, ficámos livres. Mas a cronologia das nossas opções dizem-nos mais sobre nós próprios daquilo que pensamos. Voltemos ao princípio e começemos com a análise.

Foi em 2003 que Clara Pinto Correia (CPC) certamente viveu um dos piores momentos da sua vida. E, note-se, digo isto sem qualquer conhecimento (directo) de causa. Da mesma forma que quem semeia ventos, colhe tempestades, CPC colheu as suas tempestades e segui o seu caminho. Até aqui tudo bem. CPC deixou de escrever para a Visão e como todos os problemas têm resolução, este ficou resolvido. Três anos depois, vale a pena tentar perceber porque é que cada vez que se fala em CPC ou se faz uma pesquisa simples no google alguém remata impiedosamente ou escreve uma piada que inclua obrigatoriamente a palavra plágio. Ora vamos lá fazer um esforço para ver mais claro.

É certo que este episódio deu um motivo deliciosamente escandaloso para aqueles que sempre detestaram CPC o demonstrassem de uma forma malévola e com o fim único de destruir. Nada de estranho pois é assim que o meio universitário funciona. Meio mundo a tentar lixar, algumas vezes descarada e vergonhosamente, o outro meio mundo. Porquê? Não sei. Talvez metade seja genética, outra metade seja mesmo falta de carácter e uma boa dose de provincianismo saloio. Ou então pura e simplesmente maldade. Sim. Pois. É que existem pessoas más. Existem mesmo! Mas se por um lado a reacção do meio universitário era previsível, por outro ela não pode ser entendida como uma "chicotada psicológica" do mundo científico a CPC pois não se tratou de uma fraude científica. CPC é uma cientista exemplar. Licenciou-se em Biologia na FCUL, fez um doutoramento em Biologia Celular no ICBAS do Porto (tendo desenvolvido a parte experimental no Instituto Gulbenkian de Ciência e nos EUA), fez um pós-doutoramente em clonagem de mamíferos na University of Massachussetts e especializou-se em História das Ciências na University of Harvard, sob a supervisão do famoso paleontólogo e evolucionista Prof. Stephen Jay Gould. Deu aulas na Faculdade de Medicina de Lisboa e é agora professora catedrática da Universidade Lusófona onde dirige a licenciatura em Biologia e o mestrado em Biologia do desenvolvimento. Em 2004 prestou provas de agregação em História e Filosofia das Ciências na Universidade de Lisboa. O seu mais famoso livro científico sujeito a referee é o Ovário de Eva: Ovo & Esperma & Preformação, prefaciado por Stephen Jay Gould. CPC tem também uma excelente experiência de investigação à séria, tendo inclusivamente descoberto, com os seus colegas, que o centrossoma que preside à organização do primeiro ciclo celular é de origem paterna, à excepção do rato que é de origem materna e que foi durante muito tempo considerado regra. De maneira que, independentemente das empatias ou antipatias, a carreira científica de CPC é intocável.

Depois há a reacção do público em geral. Essa, apesar de mais ampla, resume-se à crítica banal de um povo com tempo demais para a alcoviteirice e que trabalha meias verdades e o diz que disse. Desse não há mais nada a fazer do que lamentar.

Depois há a imprensa. Mas que diabo leva a revista XIS do Público a publicitar os livros da Fundação do Gil referindo todos os autores mas esquecendo-se de referenciar CPC? Não sei. Escrevi um e-mail para lá e não obtive qualquer resposta. Parece que os e-mails e os sites só servem para criar uma certa ilusão de avanço tecnológico. Isto faz com que a especulação por ausência de resposta leve a que pensemos que tenha havido uma censura inconsciente ao nome da CPC. Da mesma forma que houve, muito certamente, ao meu e-mail.

Até podiamos dizer que este é o karma de CPC. Mas não é. E não tem que ser. Por outro lado, é com muita graça e, confesso, com algum nojo, que vejo meia dúzia de saloios a apedrejar entusiasticamente os outros sem a mínima capacidade de ver o seu próprio telhado de vidro. Talvez aqui encaixasse um «Perdoai-lhes Senhor, eles não sabem o que fazem». Mas eles sabem muito bem o que fazem. E o que eles fazem é, a cada oportunidade e da forma mais requintada possível, transpirar ódio e calcular o próximo golpe. E executá-lo.

CPC plagiou. Pois plagiou. E divorciou-se várias vezes. E gosta muito de homens. E fuma desalmadamente. E aprecia um bom charuto. Será que tudo isto que gostamos de criticar à luz da moral e dos bons costumes sei lá bem do quê faz desta mulher um alvo social a abater? Terá alguém pensado no que sentem os filhos de CPC quando ouvem e vêem e lêem o chorrilho de disparates que se fala, que se mostra e que se escreve sobre a sua mãe? É claro que não pensam. É claro que essas mesmas pessoas, depois de serem más, vão para casa adormecer os seus filhos e dizer-lhes que devemos ser bons e tolerantes uns para os outros e a rezar com fé o Pai Nosso Que Estais no Céu e a Avé Maria. Eu até já trabalhei num Hospital Psiquiátrico mas confesso-vos que nunca vi tanta esquizofrenia como nesta sociedade que se diz normal e que apesar de não viver entre quatro paredes vive realmente na sua mais profunda mesquinhez de se sentirem mais qualquer coisa que os outros. Talvez um dia a arrogância e a indiferença dê lugar à tolerância e à humanidade. Talvez. Mas até lá, àqueles que sabem o que fazem: puta que vos pariu! Perdoem-me mas não há pachorra!

É claro que CPC não deve estar imune à crítica. E eu sou o primeiro a fazê-la. Não para me deliciar com o prazer do veneno a percorrer as veias da presa que não existe mas sim com o intuito de tornar qualquer coisa melhor. Construir em vez de destruir. Olhem, por exemplo, fiquei extremamente triste quando vi que CPC começou a escrever para o jornal 24 horas. Não porque considere o jornal uma treta (o que é verdadeiro) mas sim porque se pôs a jeito dos tais sedentos de vingança. E eles aí estão. E CPC não tinha necessidade nenhuma de entrar nessa guerra. É que há coisas que dificilmente mudam e na maioria dos casos não vale a pena remar contra a maré. E CPC já tinha obrigação de saber isso. Para o seu bem. Sobretudo para o seu bem.

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