segunda-feira, novembro 12, 2007

É A OCITOCINA SEUS ESTÚPIDOS

Tão fresco como uma alface. Segundo um artigo publicado na PLoS ONE, a ocitocina aumenta os comportamentos generosos entre humanos. As conclusões são interessantes. Vale a pena transcrever para aqui o abstract: «Human beings routinely help strangers at costs to themselves. Sometimes the help offered is generous—offering more than the other expects. The proximate mechanisms supporting generosity are not well-understood, but several lines of research suggest a role for empathy. In this study, participants were infused with 40 IU oxytocin (OT) or placebo and engaged in a blinded, one-shot decision on how to split a sum of money with a stranger that could be rejected. Those on OT were 80% more generous than those given a placebo. OT had no effect on a unilateral monetary transfer task dissociating generosity from altruism. OT and altruism together predicted almost half the interpersonal variation in generosity. Notably, OT had twofold larger impact on generosity compared to altruism. This indicates that generosity is associated with both altruism as well as an emotional identification with another person.» (sublinhados meus) O artigo pode ser lido aqui.

A ocitocina é uma molécula muito estudada, não só ao nível da sua caracterização químicas mas também das suas múltiplas funções biológicas. Para quem procura a verdade mecânica do ser humano, é impossível ignorá-la. Para verem a subtileza com que se retira destes estudos autênticas receitas maquiavélicas, ora vejam lá a notícia que o Público publicou em 2005:

Experiências com uma molécula natural
E se um spray pudesse aumentar a confiança que temos nos outros?
02.06.2005 - 13h24 Ana Machado, PÚBLICO

E se lhe dissessem que é possível aumentar a confiança que as outras pessoas têm em si, bastando para isso destapar uma garrafinha e soltar uma espécie de perfume da confiança? Uma equipa da Universidade de Zurique, na Suíça, e da Universidade de Claremont, na Califórnia, desenvolveu um spray nasal à base de ocitocina, uma molécula com funções de hormona e de neuromodulador, que se propõe fazer isso mesmo.

Os cientistas relatam hoje na revista científica britânica Nature que propuseram a um grupo voluntários jogar um jogo de confiança entre investidores e gestores desse investimento. Os voluntários que usaram o spray nasal de ocitocina confiavam mais nos gestores do que os que não foram sujeitos à ocitocina.

A ocitocina é mais conhecida pela sua função hormonal na contracção do útero, durante o trabalho de parto, sendo por isso usada na indução do parto, e durante a amamentação. Há ainda estudos que a relacionam com as relações de amizade e enamoramento, o fortalecimento dos laços entre mãe e filho e o comportamento sexual.

Mas ela também funciona, ao nível dos neurónios, como um péptido (uma molécula com mais de dois aminoácidos), com função neuromoduladora, produzida no hipotálamo, a grande região cerebral responsável pelo controlo das emoções, e ao nível da amígdala, o reduto cerebral dos comportamentos sociais.

Um factor de sucesso

A equipa liderada por Michael Kosfeld e Markus Heinrichs, da Universidade de Zurique, baseou-se noutros estudos que identificavam a ocitocina como um regulador neuronal do comportamento, tendo em conta as funções que desempenha nas interacções sociais positivas. O objectivo dos investigadores era ir ao encontro da origem neurológica de uma das emoções mais importantes nas relações sociais: a confiança.

"A confiança é transversal às relações em sociedade. Estudos recentes indicam que a confiança é crucial no sucesso político, social e económico. Mas pouco se sabe sobre a origem biológica da confiança entre os humanos. Tentámos mostrar que a ocitocina, um neuropéptido que tem uma importância crucial nas relações sociais entre mamíferos não-humanos, aumenta a confiança nas relações entre humanos", diz a equipa.

Os cientistas propuseram uma espécie de jogo de investimento a um grupo de voluntários.

O grupo foi dividido em investidores e gestores desse investimento. Metade dos participantes recebeu ocitocina sob a forma de um spray nasal. Os investidores recebiam então unidades monetárias que deveriam passar para as mãos do gestor do investimento, cuja identidade desconheciam. Cada investimento era triplicado.

O objectivo do jogo era medir a confiança do investidor no seu gestor, no sentido de avaliar quanto do investimento o gestor devolveria ao investidor.

Os investidores que receberam ocitocina faziam investimentos mais altos e tendiam a confiar mais nos seus parceiros. "A ocitocina aumentou a confiança dos investidores. Os que receberam o spray nasal investiram mais do que os investidores que apenas receberam placebos. Os indivíduos que receberam a ocitocina ultrapassavam melhor que os outros o medo de serem traídos", concluíram os cientistas.

Num comentário a acompanhar o artigo, o neurologista português António Damásio, investigador da Universidade do Iowa, nos Estados Unidos, afirma que o mais importante do estudo não é o facto destes voluntários terem aumentado a sua capacidade de confiar após inalarem a ocitocina.

Sem perigo de abuso pelos políticos

O que o estudo vem provar é que a ocitocina, existindo naturalmente no nosso cérebro, actua nas nossas relações sociais normalmente. E avança com outra pista: "Os autores abrem a possibilidade de investigar certas patologias em que a nossa confiança fica afectada, como no autismo, ou em casos em que é anormalmente exagerada. Certas patologias que afectam a amígdala, fazem com que os indivíduos em causa se aproximem de estranhos de modo inesperado, por exemplo", diz o autor.

António Damásio, cuja área de investigação é a de apurar a base biológica das emoções, aproveita ainda para sossegar quem pensa que este estudo pode ser aproveitado para servir causas menos duvidosas: "Alguns podem ficar preocupados com a possibilidade de alguns políticos começarem a pulverizar multidões com ocitocina durante as campanhas eleitorais. Mas de facto o mar-keting político já é sábio em activar os nossos mecanismos biológicos no sentido de atrair a confiança alheia, através de estimulação natural da produção destas hormonas. Para além de tudo isto, a equipa é responsável por dar um grande passo rumo ao conhecimento dos mecanismos biológicos de escolha."

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